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Parecer Ser é Mais Importante Que Ser de Fato?

Atualizado: 21 de jul. de 2022

Entenda por quê esta situação é tão comum na área corporativa, como superar esta crença e desenvolver sua carreira mostrando o seu real valor ao invés de se preocupar com os rótulos.



Cesare Lombroso nasceu na cidade de Verona, bem conhecida como a terra de Romeu e Julieta, em 1835. Formou-se em Medicina na Universidade de Pavia em 1858, aos 23 anos. Profissionalmente, foi médico, e intelectualmente um filósofo. Começou o exercício da medicina imediatamente ao ser laureado médico, especializando-se mais na psiquiatria.


Ao ser nomeado diretor do manicômio na cidade de Pesaro, iniciou sua ligação com os doentes mentais, a quem dedicou grande parte de seus estudos e sua vida. Importante foi sua vivência psiquiátrica, ao relacionar a demência com delinquência. Suas experiências nessa área forneceram a ele as bases para a produção de uma de suas obras mais relevantes no âmbito da psiquiatria; Gênio e Loucura, publicada em 1870.



Vários outros estudos se derivaram desta primeira obra acima. Em especial, destacaremos aqui o livro "O Homem Delinquente" de 1876, onde Lombroso contribui de maneira expressiva com o desenvolvimento e aperfeiçoamento do direito criminal, se destacando mundialmente como o criador da Antropologia Criminal. As teorias revolucionárias desta obra deram nascimento a várias iniciativas, como o Museu Psiquiátrico de Direito Penal, em Turim, a Escola Positiva de Direito Penal, e o mais importante de todos, e até hoje relevante nas escolas de Direito: A Teoria do Traço Delinquente.


Esta teoria preconiza que o conjunto de traços físicos e psicológicos específicos determinam se o indivíduo tem inclinação ou se o mesmo é, de fato, um criminoso nato. Lombroso mencionava, ainda, que a hereditariedade é uma das grandes causas da criminalidade, realçando a importância de seu conhecimento no âmbito criminal. Além do criminoso “nato” (atávico), Lombroso ainda distinguia mais cinco grupos de delinquentes. São eles:

  • o delinquente moral;

  • o epilético;

  • o louco;

  • o ocasional; e

  • o passional.

Entretanto, dentre as seis classificações acima, deu atenção especial ao delinquente nato e ao delinquente moral. Utilizou, inclusive, um capítulo específico em sua obra para fazer tais apontamentos. Desse modo, indicou distinções e correlações características à certas aparências observáveis. No que tangia à fisionomia do homem criminoso, afirmava que tais indivíduos apresentavam mandíbulas volumosas, assimetria facial, orelhas desiguais, falta de barba nos homens, pele, olhos e cabelos escuros.


Acervo sobre os estudos de Cesare Lombroso.

Também relacionou à figura criminosa o peso do indivíduo, suas medidas do crânio, insensibilidade à dor, presença de tatuagem, a falta de senso moral, o ódio em demasia, a vaidade excessiva, entre outras características sempre relacionadas à aparência.


Ainda neste sentido, é interessante mencionar que a aparência não foi a base conceitual apenas do estudo de Lombroso. Esta sempre foi um fator crítico e fundamental no exercício de conceituar algo ou alguém. Muitas vezes, conceituamos somente pela aparência sem fazer prova alguma quanto a evidência ou hipótese; chamamos isso de uma conceituação prévia, imutável e única, ou seja, o pré conceito.


Um exemplo simples e didático é a imagem que abre este artigo. Nesta imagem temos 5 pessoas; qual ou quais delas você conceituaria como criminosa(s)? Interessante lembrarmos que pré conceituar, é sobretudo, um pré julgamento, quase sempre embasado naquilo que parece ser.


Daniel S. Hamermesh, em seu livro "O valor da beleza", mostra que pessoas atraentes têm mais sucesso. Para o autor, o campo no qual a beleza mais influencia é em setores de relacionamentos ou de contato direto com o cliente. Para ele, vendedores de boa aparência são mais persuasivos, chegando a tornar os produtos vendidos mais desejáveis.


Ele ainda afirma que as evidências sugerem que os custos extras ocorridos pela empresa quando paga por trabalhadores de melhor aparência são pelo menos parcialmente compensados pelas vendas maiores que esses funcionários conseguem gerar para ela. Ou seja; para a empresa, compensa pagar um salário maior para os vendedores de boa aparência, pois estes revertem esse gasto em maiores vendas, gerando assim uma maior receita para a organização como um todo.


Ainda sobre a obra de Harmermesh, é impossível afirmar que uma pessoa ganhou mais do que outra durante a vida apenas por ter melhor aparência; o que ele cita é que, em condições de habilidades parecidas, a chance de uma pessoa considerada acima da média em aparência ganhar mais do que outra são maiores.


Este fenômeno não é encontrado somente no âmbito antropológico. Um estudo sobre rótulos de vinho, realizado pelo enófilo e barista João Carlos Pinheiro, pela Universidade de Bonn e a escola de Administração INSAD, comprovou que as pessoas atribuem melhor sabor e qualidade aos vinhos que aparentemente são de rótulos mais caros e conhecidos.


O estudo utilizou uma interessante configuração que envolvia examinar cada voluntário em um aparelho de Ressonância Magnética no momento em que degustava cada uma das amostras oferecidas. Supostamente eram 3 vinhos: um de preço popular, um de preço médio e outro que seria o mais caro de todos. Na verdade, o golinho que cada um provou era de um mesmo tinto, que custava cerca de US$ 15.00. Ambos sexos foram testados e as respostas foram consistentes com o famoso “Quanto mais caro melhor”!


De acordo com o estudioso de vinhos, "...nunca podemos julgar um vinho sem que ele se apresente primeiro. Antes de tudo, temos que prová-lo, conhecer sua origem, o que ele passou até chegar em sua taça, e só então, observamos finalmente o rótulo que ele carrega." O efeito "rótulo de vinho" é muito observado também nas relações corporativas. Em geral, o profissional é logo rotulado, e cabe a ele, provar se aquele rótulo é coerente ou não à sua personalidade.


Muitas pessoas, percebendo este fenômeno, acabam escolhendo a maneira, aparentemente, mais fácil de se lidar com esta situação: tentam aplicar algumas lições de Nicolau Maquiavel encontradas em seu livro "O Principe". Nesta obra tão amplamente discutida, Maquiavel deixa claro no capítulo XV "As qualidades pelas quais os homens, sobretudo os príncipes, são louvados ou vituperados", que no processo de recebimento de autoridade, "ser" e "parecer ser" são igualmente considerados, mas que "parecer ser" é sempre preponderante. Por isso, se você ainda não é, simplesmente "pareça" ser!


Como consequência, temos visto um número cada vez maior de profissionais que "compreenderam" ser esta a receita do sucesso rápido na área corporativa; simplesmente "jogar o jogo." O que consolida ainda mais esta crença nas áreas corporativas, é que na maioria das vezes esta tática funciona, contudo, o profissional que se beneficia deste fenômeno não apenas estará estagnado no seu primeiro patamar de sucesso, como não saberá acompanhar as transformações e mudanças que sua organização adotar; e consequentemente, se tornará irrelevante com o tempo e ainda, será alvo de questionamentos como: "Por que será que 'fulano' conseguiu chegar até este cargo?"



Esta situação é claramente apresentada por Marshal Goldsmith, autor e consultor eleito pela Harvard Business Review e pelo The Economist Intitute como um dos dos conselheiros executivos mais confiáveis na nova era de negócios. Em seu maior best-seller do New York Times: “What Got You Here Won’t Get You There”, ele mostra como talentosos executivos caem facilmente na armadilha de acreditarem que o primeiro patamar de sucesso é onde ele continuará para sempre. Ou ainda, que a mesma "receita" que o trouxe até o primeiro estágio de sucesso, será a mesma que o levará para os próximos.


Goldsmith apresenta 20 hábitos que impedem um executivo de grande potencial alcançar os próximos estágios de sucesso. Este hábitos são fortemente enraizados em crenças cristalizadas no subconsciente coletivo que impedem o executivo provocar as mudanças e transformações necessárias e alavancar definitivamente sua carreira.


Entre estas crenças, o autor destaca a tão atrativa e perigosa armadilha de sempre procurar "parecer ser". Pois ao adotar esta postura, o executivo colocará em prática a herança recebida de modelos anteriores de líderes que hoje são completamente obsoletos.


Mas como sair da zona de conforto do "parecer ser" ou até mesmo evitar cair nesta armadilha? Bem... o primeiro passo é entender o que Nicolau Maquiavel quis realmente dizer no capítulo XV de sua obra. É muito importante entender o contexto deste livro, que foi um presente de aniversário de um conselheiro ao seu príncipe. Nesta obra, Maquiavel deixa claro que o melhor presente que ele poderia dar ao seu príncipe, ao contrário de outros oferecidos pelos seus nobres, seria o conhecimento; dicas práticas de como se tornar um bom governante.


Assim sendo, Maquiavel deixa claro que no processo da mudança entre "não ser" e "ser de fato" um bom governante possui sempre duas etapas: o estímulo para a mudança e a escolha pela mudança. Sabendo que nem todas as grandes mudanças são simples de serem praticadas, começar "agir como se fosse" é um excelente primeiro passo até que toda a mudança seja implementada e então passar a "agir como se é" de fato. Em poucas palavras, se você ainda não consegue ser, comece por parecer ser.


O segundo passo, seria observar alguns comportamentos que te levam a esta armadilha do "parecer ser" e eliminá-los com a prática de novos outros, tais como:


1. Orientação para o resultado: Quando me oriento apenas para a tarefa, é porque geralmente quero realizar somente o mínimo necessário para cumprir a meta, evidenciar meu potencial e alavancar minha carreira. Esta é uma armadilha de "parecer ser", pois quando algum projeto, ou transformação organizacional "cair em meu colo" não terei um processo definido de como lidar com esta nova situação; na verdade, eu terei que criar novos processos e caminhos rumo a mudança desejada.


2. Utilização dos canais de comunicação: Evidenciar minhas entregas de valor é muito importante no processo de desenvolvimento da minha carreira, contudo, é muito mais tentador viver "cacarejando", mesmo quando não há ovo algum. Evidenciar a todo tempo alguma coisa que eu fiz é um passo para a armadilha do "parecer ser". Preciso utilizar sempre os canais de comunicação já existentes na minha organização para comunicar minhas entregas de valor; somente quando estas, de fato, acontecerem.


3. Gestão da carga e capacidade: Quando minha carga e capacidade não estão claras para o meu gestor e para mim mesmo, fatalmente ficarei sobrecarregado, e para não "manchar"a minha reputação de "entregador de valor" vou ser tentado em assumir a posição de "parecer" entregar. De início, isso pode ser exequível, mas ao longo do tempo me colocarei em uma situação completamente insustentável, podendo manchar de fato minha reputação como profissional. Preciso saber até onde posso dizer sim e quando devo dizer não.


4. Contrato de expectativas: É muito comum na área corporativa eu "herdar" um projeto ou função simplesmente por que eu colaborei com a atividade. Se as expectativas não estiverem claras, eu poderei ser cobrado por algo que não é de minha responsabilidade. Esta situação, também me coloca na armadilha de "parecer ser" e pior que esta armadilha, é a quebra altas de expectativas.


5. Papéis e responsabilidades claros: É muito importante que o que faço e o que não faço estejam claros para todos. Não se trata de se esconder no "biombo" do processo e sempre focar no mínimo necessário, mas em um alinhamento de expectativas, bem como a melhor gestão do meu tempo. Esta dica é valiosa, pois se os meus papéis e responsabilidades não estiverem claros, posso "parecer ser" inapto ao meu escopo de trabalho.


6. Feedback e feedforward: É muito importante que eu tenha um canal aberto e seguro com o meu gestor por onde recebo valiosos feedbacks e por onde compartilho minhas impressões e expectativas sobre meu desempenho (feedforward). Quando meu gestor conhece de fato quem sou, meus talentos e onde quero chegar, evito cair em alguma situação para qual não tenho expertise e consigo estabelecer um plano de desenvolvimento de talentos e habilidades que não somente me aprimorarão, mas contribuirão para as transformações desejadas pela minha organização.


7. Equação 70-20-10: Preciso dividir o meu tempo de modo que 70% dele seja para minhas atividades "core", 20% para as atividades e eventos relevantes da empresa que me colocam em evidência e 10% para qualquer projeto relevante pessoal. Isso faz com que eu apresente meus pontos positivos como profissional e como pessoa, e sobretudo, me desenvolve quanto às novas habilidades, me expondo positivamente para a empresa e na área onde trabalho.


Evitar "parecer ser" e “ser de fato“ não são um desafio simples, pois além de ser uma batalha contra crenças, também é uma luta contra julgamentos e preconceitos que estão inconscientemente enraizados em todos nós. E por mais que acreditamos não sermos influenciados pelos vieses culturais e sociais locais, ainda sim somos.


Olhe mais uma vez para a imagem que abre este artigo. Diga agora, qual ou quais daquelas pessoas é ou são criminosa(s)? Você conseguiria distinguir utilizando somente a teoria do Traço Delinquente de Lombroso? Você tem 30 segundos para analisar e formar uma opinião antes de continuar sua leitura...



Em Dezembro de 2008 Bernie Madoff foi detido pelo FBI e acusado de fraude. Suspeita-se que a fraude tenha alcançado mais de 65 bilhões de dólares, caso que o torna uma das maiores fraudes financeiras levadas a cabo por uma só pessoa.



Luciane Hoepers participou de um dos maiores esquemas de fraude e desvio de dinheiro de fundos de pensão do Brasil descoberto em 2013 pela operação Lava-jato. Estima-se que foram movimentados neste esquema cerca de 300 milhões de reais.



Frank Abagnale foi falsificador de cheque nos Estados Unidos, dos 15 aos 21 anos. Assumiu oito identidades, incluindo um piloto de avião, um médico, um agente do FBI e um advogado. Não se sabe ao certo quanto milhões foram roubados....



A jornalista e advogada Luana de Almeida Domingos foi presa em 2017, acusada de envolvimento com facção criminosa PCC. A princípio sua pena foi de cinco anos e três meses em regime semiaberto.




Harold Shipman, foi um médico que matava seus pacientes por envenenamento entre 1970 e final de 1990. Conhecido como "Doutor Morte", foi acusado de 345 assassinatos. No ano 2000 foi condenado a prisão perpétua, e 4 anos depois suicidou-se na sua cela.




Isto posto... finalizamos aqui.

Boas reflexões!

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